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       Em Phortu tudo era tanquilo, rotina leve, cidade pequena, pouco habitantes, todos se conheciam, caracteristicas que chamavam atenção de muitos visitantes. Certo dia, ao voltar do trabalho paro em uma pracinha para aproveiatar o resto da tarde, observando as pessoas, cumprimento um ou outro, compro uma pipoca de seu Tonico que me dá uma notícia um tanto quanto incomum, seu Bernardo e os filhos da loja de coveniência da praça iriam se mudar e semana que vem teríamos uma nova vizinhança. Por mais que achasse estranho propus-me a não julgar, despeço-me de seu Tonico e volto para casa.

       Com o passar dos dias a notícia se espalha pela cidade, uns dizem que era um ex-general das forças armadas, homem rude, outros afirmavam que na realidade era um comerciante que havia falido na cidade grande ou até mesmo um dono de cabaré que estava fugindo da polícia, certamente curiosidade era o que não faltava em Phortu. A semana começou e com ela o caminhão de mudanças de seu Rodolfo, o novo morador, um senhor aposentado estatura meã, cabelos brancos, sem muitas palavras ou até mesmo expressões chegou e pôs fim no misterio, ele passava o dia lendo deitado em uma rede do sua tão amada seleção brasileira, não saia muito só recebia visitas de uma moça, que nunca vi, mas diziam que era sua filha.

      Na volta da feira distraido, tenho um enorme susto, deixo uma fruta cair e quase atorpelo um idoso numa tentativa de desviar, acabo batendo minha bicicleta em um hidrante, não me machuco tanto, mas deixo preocupado o pobre senhor que me ajuda a levantar, perguntando-me se estou bem, atencioso me leva até sua casa e oferece-me um copo d'água, aceito e começamos a conversar descubro então que é o novo morador, as horas passam, ele fala um pouco de sua vida e conta, orgulhoso, sobre sua filha médica, a qual sente muitas saudades. A casa era bem agradável mas um baú antigo muito bonito destoava-se, o que chamou minha atenção. A conversa acaba quando pergunto sobre sua esposa, desconfortável, ele diz que está cansado e precisa dormir, despeço-me e vou para casa.

     No dia seguinte, amanheço com uma estranha sensação, vou ao trabalho, passo pela pracinha e cumprimento seu Rodolfo que logo cedo já está na rede verde e amarela lendo. Ele pede que eu apareça mais tarde para conhecer sua filha. O dia passa depressa, no caminho compro algumas coisas para levar ao seu Rodolfo, ao chegar, sua filha Marisa é quem abre a porta, perguntando-me se eu era o famoso Murilo, um pouco envergonhado com a situação surpreendente e com a beleza de Marisa confirmo e logo em seguida ela pede que eu entre. A feição de seu Rodolfo não escondia a felicidade de ter sua filha por perto, a conversa agradável atravessa a noite, seu Rodolfo se recolhe e Marisa e eu continuamos por mais algumas horas pergunto sobre sua mãe mas ela diz que morreu no parto e que seu pai nunca lhe contou muito sobre ela mas não perguntava tentopara não entristece-lo. Mudando de assunto ela fala sobre sua infância, escola, timidamente pergunto se tinha namorado ou era casada, para minha infelicidade, namorava há dois anos. Marisa era simplesmente incrivel, sorriso doce, fala mansa, olhos que brilhavam cada vez que pronuciava, nunca havia conhecido alguém assim.

       Já em casa passei o dia lembrando de Marisa, seu jeito delicado e ao mesmo tempo independente encantou-me e fez com que esquecesse a sensação que tive ao acordar, cansado da ótima noite durmo. Ao acordar o sentimento estranho retorna, agora um pouco mais forte e começa a preocupar-me. Vou até a praça, a cidade parecia está vazia nem seu Tonico estava fazendo suas vendas. Andando um pouco mais encontro parte de uma carta, amarelada, tento lê-la, mas uma chuva muito forte começa a cair e preciso sair correndo, guardo-a no bolso. Na correria ao passar pela ponte acabo furando em um espinho o pneu da bicicleta e tenho que ir a pé então acabo encontrando seu Rodolfo à beira da lagoa com o baú antigo cheio de cartas e uma tesoura cortando-as, corro até ele. Aos prantos ele pede que eu cuide de Marisa, pergunto o que está acontecendo, pondo a mão no peito e apertando meu braço, olhos arregalados ele não consegue responder, peço socorro, ninguém aparece, seu Rodolfo aos poucos desfalece, e nos meus braços pede pela ultima vez que cuide de sua filha, chega a ajuda mas já era tarde. Encontro, já no hospital, Marisa muito triste mas mantendo-se firme,  entrego a ela o baú de seu pai a levo pra casa dele, ela passa a noite observando cada detalhe da casa e procurando motivos que expliquem o porque de seu Rodolfo está rasgando as cartas, ela sabia que ele sentia muita falta de sua mãe mas mesmo assim tudo ainda estava muito confuso. A noite passa e o cansaço vence, observando-a dormir, durmo também, ao acordar Marisa está sentada colando e lendo as cartas que seu pai rasgou, boa parte falava de dona Marília, sua mãe, como se conheceram, as primeiras fases do namoro, as primeiras cartas de um pro outro, algumas fotos, outras descreviam todos os passos de Marisa desde seu nascimento como se informasse à dona Marília, no fundo acabou encontrando um exame médico atestando poucos dias de vida, entra em prantos se questionando tristemente como não soube deste diagnóstico, como mesmo visitando seu Rodolfo não esteve presente o suficiente. Na parte de cima do verso  do exame algumas palavras dedicadas à Marília as quais enunciavam um reencontro e no rodapé um pedido para que Marisa não se culpe e que a amava muito, então ela me abraça, fico mais uma noite ao seu lado.

       Um outro dia começa e para minha felicidade Marisa já está melhor e como sempre decidida, mas traz uma noticia que não me agrada. Como uma bomba jogada em meu colo, ela agradece o apoio dado nesses dias difíceis, diz que colocou a casa a venda e que irá morar fora com seu namorado. Não consigo disfarçar o quanto esta bomba me destruiu, sentia como se uma parte de mim estivesse simplesmente desaparecendo. Passei o resto da infeliz tarde me preguntando o porque desse sentimento não ser recíproco. Ao voltar pra casa e passar pela praça lembro-me de seu Rodolfo, do quento ele era alegre aqui e logo lembro de Marisa e do sorriso fácil que era rotina em nossas conversas, sinto-me sozinho mas procuro levantar a cabeça e assim continuo minha rotina por anos até que em uma viagem à capital recebo uma surpresa encontro Marisa em um restaurante, quase não a reconheço mas ela vem até mim. Conversamos, o tempo não parecia ter passado para ela, ainda era o mesmo sorriso encantador, ela pediu desculpas por todo o ocorrido, diz que após um tempo ficou pensando no quanto sentia minha falta, pergunto se ela ainda estava namorando e para minha felicidade, não. Chamo-a para passar um fim de semana em Phortu e ela aceita. Já em Phortu, ansioso arrumo mil coisas para recebe-la, flores, comes e bebes, ela chega, por problemas no trabalho acaba pedindo pra ficar um pouco mais e assim a conheço melhor e percebo um sentimento recíproco que me dá uma ideia arriscada mas que tenho certeza que valeria a pena. Compro velas, rosas, preparo todo um ambiente, espero ela chegar, e em um bau semelhante ao de seu pai coloco uma surpresa. Marisa chega e fica maravilhada observa cada detalhe preparado, a noite foi uma das mais agradáveis de nossa vida, então chega o momento de trazer o bau, ela logo reconhece e peço que abra, ao fazer isto ela abre um sorriso que jamais havia visto, o anel com o pedido de casamento refletiram em seus olhos, Marisa aceita e no mesmo momento uma brisa forte adentra a casa como se estivesse feliz e  confirmando nosso compromisso.

Baú

M.Xr
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