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Débora Biase

Feijão com Arroz

          São cinco horas da tarde, hora de começar o trabalho. Veste as luvas em suas mãos brancas, amarra o avental amarelo de beirada azul e põe a touca em seus cabelos enrolados escuros. Pronta, ela respira fundo e observa ao seu redor: ao lado esquerdo as panelas organizadas por tamanho, ao lado direito as colheres e conchas junto com os facões pendurados em ganchos na parede, a sua frente a pia grande ao lado do fogão de quatro bocas pequenas e uma grande mesa no centro. Atrás de si estão todos os mantimentos necessários para preparar as refeições do cotidiano.

          Começa então as escolhas: primeiro as panelas, depois os talheres e por fim os quilos de alimentos. Por questões de higiene e costume decide lavá-los antes de usar e em seguida enche a panela com água da pia e põe ao fogo alto para aquecer. Por estar nesse ambiente há algum tempo, sabe bem por onde começar e por onde terminar. Para ela cada detalhe é essencial a fim de que tudo saia perfeitamente. Ela crê que cozinhar é como um espetáculo: é preciso muita organização, treino, dedicação, conhecimento e amor, para que no final os cinco sentidos o aplaudam de pé.

          Os braços, as pernas e principalmente a cabeça da moça não param de trabalhar um segundo sequer: do feijão já tem que ir atrás do arroz, do arroz deve pensar na carne e assim vai a noite toda. Mexe panela, arruma prato, desliga fogão, lava louça, tudo isso ela faz sem qualquer tipo de auxílio e todos a esperam em silêncio, ansiosos. Ela não é a única no palco que ama o que faz, todos da rua adoram sua comida. Simpática e sorridente ela finaliza o primeiro prato da noite e já entrega:

          - Aqui seu José, quentinho como o senhor gosta!

          - Ô minha filha, que Deus lhe pague! - responde o primeiro da fila de mais ou menos 40 pessoas que não comem desde a noite anterior.

          Ela responde com um sorriso ansioso, de como alguém que espera algo a mais. Ele coloca a primeira colher cheia na boca e logo em seguida balança cabeça quase sorrindo de boca cheia. Agora sim, esse é o sinal de pagamento do moço para com aquela jovem que enfim recebe o sentimento de dever cumprido. Todos da fila respondem a ela da mesma maneira, vez após vez. Por isso é correto afirmar que “todos da rua adoram sua comida”.

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