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    O tempo estava nublado, provavelmente choveria durante aquele dia inteiro. Era completamente normal na firma todos ficarem mais pensativos e cansados em tempos chuvosos e isso não era nem um pouco diferente comigo.

     Levantei-me de meu local no repartimento de administração de contas da empresa pegando minha caneca preferida que havia ganhado de minha ex-namorada e dirigi-me à sala de descanso para poder pegar mais café. Chegando ao local, percebi que alguns colegas do repartimento riam e observavam a tela de um pequeno aparelho telefónico, apenas fiz-me de desentendido, colocando a caneca na máquina de café e esperando que os dois minutos passassem para poder beber aquela bebida que me mantinha acordado durante estes dias.

Encostei-me na bancada e cruzei os braços, olhando fixamente para o chão e torcendo para que aqueles dois minutos fossem os mais rápidos da minha vida, mas antes que o tempo acabasse, parece que meus colegas perceberam minha inquietação e cochicharam entre si. Retirei minha caneca da máquina e voltei para meu lugar na repartição.

    A minha área de trabalho era pequena, mas bem organizada. Eu não era um maníaco por organização, mas gostava de manter tudo em seu devido lugar, o que parecia ser um problema para meus colegas de trabalho, já que muitos sempre chegavam perto de minha mesa e espalhavam clipes e papéis por toda a superfície de madeira. O melhor daquele meu pequeno local era que as janelas do prédio ficavam bem ao meu lado, fazendo com que eu pudesse observar a monotonia do cotidiano do centro da cidade. A visão para a rua era muito nítida, mas avistava as pessoas, carros e outro objetos em um tamanho bem reduzido.

    Ao olhar fixamente para aquela pequena parte da cidade, pensei em como a vida é sempre a mesma para todos. Nascemos, somos criados pelos nossos pais e então vamos para a escola, onde somos obrigados por meio de provas a mostrar-nos totalmente inteligentes e compatíveis com aquilo que as pessoas escolhem para nós e saímos para as faculdades de Medicina, Engenharia ou Direito, já que muitos não aceitam outras que não essas. Ao sair deste ciclo estudantil, ainda devemos procurar emprego para conseguirmos nos sustentar e trabalharmos durante toda a nossa vida, tendo descanso somente ao final dos 60 anos. Agora, será que todo esse esforço que fazemos realmente vale a pena? Até mesmo quando pensamos diferente e tentamos agir por nós mesmos, somos julgados e viramos motivos de brincadeiras de mal gosto.

     Apenas por ser organizado em excesso e por acabar me cuidado mais do que a maioria dos homens faz, os meus ‘’colegas’’ de trabalho acabam me tratando com brincadeiras que a cada dia ficam mais sérias. “Você não merece a namorada que tem”. “Ela finalmente te trocou por um homem de verdade”. Expressões de ódio ou inveja? Não sei, mas, apenas por olhar por aquelas janelas enormes, eu conseguia ver várias bolinhas coloridas que representavam pessoas diferentes, com opiniões diferentes e jeitos diferentes. Não importavam suas opções sexuais, seus comportamentos ou suas aparências, todos apenas continuavam a viver suas vidas andando em direção a suas escolas, trabalhos ou casas e eu apenas continuava a pensar: Quando seremos realmente aceitos sem os padrões impostos?

“Luís, você é bastante organizado, não é?”, a voz de Luísa retirou a minha atenção da visão das janelas. “Espero que você continue assim, hoje em dia é difícil encontrarmos pessoas focadas no que fazem. Gosto do jeito que você é e como trata as coisas”.

    Quantas vezes vamos precisar pensar sobre a vida e quanto tempo durará para que mais pessoas não julguem as outras como padrões de algo inventado? Espero que não muito.

Sorri ao ver Luísa deixando meu repartimento e voltei a olhar a janela. Ah... Finalmente a chuva veio!

Monotonia

Karoline Fortes
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