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Ônibus

Felipe Franco

            — Por que essa cidade é tão quente!? — exclamei na parada de ônibus. Tinha ido ao Centro para comprar os enfeites do aniversário da Julinha, e agora tinha que chegar em casa.

            Depois de uns 15 minutos, o ônibus finalmente passou. Cheio, pra variar. Um rapaz que estava sentado me viu e chamou minha atenção:

            — Ei, moça, a senhora quer se sentar aqui?

            — Sério? Obrigada.

            Ele se levantou, e pude olhar pra ele de um jeito melhor. Era um rapaz bonito e bem arrumado, só um pouco magro demais. Parecia ter a idade do meu neto, então provavelmente quase um adulto. Vi que ele tinha um buquê de flores, e perguntei:

            — Você quer que eu segure o buquê pra você? Ele parece um pouco pesado.

            — Por favor — disse enquanto me entregava o buquê. — Muito obrigado.

            Arrumei as minhas sacolas ao meu pé, e peguei o buquê. O trânsito parecia estar mais congestionado que o normal, o ônibus quase não andava. Eu realmente devia ter ido comprar as decorações na terça. Passamos por diversos pontos, e no caminho eu conversei com a moça que estava ao meu lado. Ela ia visitar a mãe, que estava doente, coisa que duvido que meus filhos fariam. Quando chegou à sua parada, ela deu lugar ao rapaz. Ele se sentou e eu lhe entreguei o buquê.

            — Para quem é o buquê? — perguntei.

            — Eu vou a um encontro — respondeu. — Hoje é dia dos namorados. E a senhora, só passeando?

            — Eu fui comprar as coisas pro aniversário da minha sobrinha, que o aniversário dela é amanhã — falei, e mostrei a sacola pra ele.

            — Sério? Quantos anos ela vai fazer?

            — Provavelmente uns 25. Ela é a única que ainda insiste em fazer uma festa em família.

            — Ah, mas essas são tão boas…

            O silêncio tomou conta do espaço (na medida do possível, com o trânsito barulhento). Um pouco depois recomecei a conversa:

            — Como é a sua namorada?

            — A minha namorada? — ele parou um pouco, provavelmente pensando, mas logo se endireitou e respondeu. — Ela é… extremamente linda, além de ser a pessoa mais simpática que eu já conheci. Sabe, daquelas que são sociáveis mas não extrovertidas, que sabem exatamente como fazer o seu dia melhor, não importa o que esteja acontecendo.

            — Pelo visto você gosta bastante dela, não é mesmo?

            — Sim! — respondeu com um sorriso no rosto

            — Como você conheceu ela?

            — Foi de um jeito bem… estranho, eu acho. Eu estava em uma livraria, e a vi. Ela é… alta e magra, com um cabelo castanho e curto extremamente lindo, além de ter aquele seu ar de simpatia. Foi paixão à primeira vista. Vi que ela tinha pego o livro mais novo de um dos meus autores favoritos, um que eu ainda não tinha comprado, então, peguei uma cópia e fui pro caixa. Mas, na fila, ela percebeu que eu basicamente a segui, mesmo sendo sem querer, e acabou conversando comigo. No fim da história, nós trocamos números e conversamos até vir aquele “um pouco mais” pra começarmos a namorar.

            — Hoje em dia é bem mais fácil de conversar, né? Quem dera que no meu tempo fosse assim. Mas a história de vocês é bonita — respondi. — E onde vocês vão se encontrar? Você não vai se atrasar?

            — No Manauara, o shopping mais perto da casa dela. Eu não acho que vá me atrasar, eu já sabia que provavelmente teria trânsito, então, eu saí mais cedo de casa. Eu quero que tudo seja perfeito hoje.

“Esses dois devem formar um casal muito bonito”, pensei. O silêncio não demorou muito tempo, ele já continuou a conversa:

            — E a senhora, tem filhos?

            — Tenho sim, três. A Raquel, o João Paulo e a Maria. Mas os três moram fora do estado agora, e como eu nunca tive a oportunidade de casar com o pai deles, agora eu moro sozinha… Mas isso não é muito importante, só um detalhe.

Ele me olhou com um brilho nos olhos por poucos segundos, e continuou:

            — Eles moram fora do estado? Que legal! O que eles estudaram? Ou ainda estudam?

            — Eles já se formaram — respondi com um sorriso. — A Raquel decidiu virar psicóloga, trabalha em uma clínica famosa lá pelo Sul. O João Paulo estudou física e agora é um professor, e a Maria fez medicina, mas como ela vive viajando, eu não sei onde ela mora agora…

            — Hum… entendi.

            — Você pareceu um pouco animado quando eu falei sobre estudar fora… Quer fazer faculdade em outro lugar?

            — Sim! Eu queria fazer um intercâmbio, pra poder fugir um pouco daqui e poder conhecer sobre outras culturas — disse, sorrindo.

            — Você já começou a estudar e pesquisar por isso? A minha sobrinha quis fazer intercâmbio também, mas ela acabou não sendo tão ativa quanto ela deveria…

            — Eu já fiz a prova pra um intercâmbio dos Estados Unidos, e tô bem confiante. O único problema vai ser convencer minha família.

            — Por quê? Eles não querem que você fique longe?

            — Não exatamente isso… Digamos que eu estou em maus termos com eles.

            A próxima parada era a dele. Ele se levantou, apertou o botão para sinalizar a parada e se despediu.

            — Qual é o nome dela? — fiz uma última pergunta.

            A porta se abriu. Ele olhou para fora, e depois para mim.

            — O nome dele é Fernando — disse, e desceu do ônibus.

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