


MUIRAQUITÃ

Análise de Amor de Caboclo, de Cassiano Ricardo
Amor de caboclo
O caboclo na sua choupana,
à hora em que a tarde desmaia vestida de chita
está pensando naquela estrangeira bonita
que viu apanhando café na fazenda.
(Os grãos de café debulhados
pareciam rubis e esmeraldas redondas
caindo em balaios dourados)
Um par de bois vagarosos rodeia rodeia
fazendo rodar os cilindros da moenda
uns agarrados aos outros
por dentes rombudos de pau.
Passa gritando no céu sertanejo
o último pica-pau
“Ela não é brasileira...
Ela veio outro dia
trazendo goiabas maduras
na cesta dourada.
Ela parece de tão estrangeira
uma formiga ruiva.
Mas poe ela (ele pensa)
eu era capaz de fazer uma casa
e de plantar uma goiabeira...”
E já sentia na boca
o caldo das melancias com cheiro de terra
e o gosto matutino das goiabas...
*Rombudos – o mesmo que gastos.
É fato que Cassiano Ricardo possui uma grande variedade de poemas, o que o fez se destacar na Geração de 22. O poema apresentado possui um título, de certa forma, peculiar, diferente: “Amor de Caboclo”, o que acaba por demonstrar qual tema o poeta irá tratar, através do próprio significado da palavra “Caboclo”: um indivíduo que resulta da mistura entre branco e índio, ou seja, um mestiço.
Dessa forma, o poema começa da seguinte maneira: “O caboclo na sua choupana, / à hora em que a tarde desmaia vestida de chita/ está pensando naquela estrangeira/ bonita que viu apanhando café na fazenda.”. O caboclo em sua casa humilde observa uma estrangeira, ou seja, isso remete à mão de obra imigrante que começou a trabalhar nas fazendas de café logo após a abolição da escravidão no Brasil. Contudo, sabe-se que isso trouxe uma série de problemas ao Brasil pelo fato de marginalizar algumas pessoas, é o que se percebe no poema quando o autor contextualiza tal situação. Ou seja, o caboclo, à margem observa a estrangeira, trabalhando na fazenda tal como dito em: “(Os grãos de café debulhados pareciam rubis e esmeraldas redondas caindo em balaios dourados)”/ Um par de bois vagarosos rodeia rodeia/ fazendo rodar os cilindros da moenda / uns agarrados aos outros / por dentes rombudos de pau. / Passa gritando no céu sertanejo / o último pica-pau”. Há também a descrição dos equipamentos nesse trecho, o que remete de novo à imagem que o autor queria construir da sociedade.
O poema encerra da seguinte forma: “Ela não é brasileira... /Ela veio outro dia / trazendo goiabas maduras / na cesta dourada. / Ela parece de tão estrangeira / uma formiga ruiva. / Mas poe ela (ele pensa) / eu era capaz de fazer uma casa / e de plantar uma goiabeira...” / E já sentia na boca / o caldo das melancias com cheiro de terra / e o gosto matutino / das goiabas... termina de maneira bela. Claro que há inúmeras interpretações para esse fim, sendo uma delas a seguinte conclusão: o caboclo se apaixona pela estrangeira e faria o possível para construir uma vida com a moça que o atrai, e o poema termina com o rapaz imaginando como seria seu cotidiano, outra interpretação seria que o rapaz gostaria de ser um dos participantes da economia, uma vez que ele observa o que é necessário, os equipamentos para adquirir, e a estrangeira para contratar, e a partir desse ponto, o caboclo imagina e planeja. O que reforça essa outra conclusão é o fato do caboclo estar em uma pequena casa (choupana), gostaria de melhorar sua vida e observa uma fazenda próxima. Contudo, isso não deixa de lado o fato dele se apaixonar, em uma ou outra conclusão, pela beleza da moça estrangeira tal como dito em: “Ela parece de tão estrangeira / uma formiga ruiva. / Mas poe ela (ele pensa) / eu era capaz de fazer uma casa / e de plantar uma goiabeira”, a conclusão mais coerente seria a primeira, talvez o rapaz apenas queria a moça por perto pelo fato de achá-la bonita.
Os temas desse poema são: O Cotidiano e a sua simplicidade, o amor, e até mesmo uma retratação social. Quanto aos aspectos formais, os modernistas não costumavam seguir à risca tais regras. Logo, o autor fez um poema de rimas irregulares e metrificação da mesma maneira. Em suma, o poema é contextualizado em sua época, e apresenta algumas conclusões diferentes, o que o faz ser um poema bastante diferente dos demais escritos dos primeiros modernistas.