


MUIRAQUITÃ

"Banzo"
E por que deixou na areia do Congo
a aldeia de palmas;
e porque seus ídolos negros
não fazem mais feitiços;
e porque o homem branco o enganou com missangas
e atulhou o porão do navio negreiro
com seu desespero covarde;
e porque não vê mais de ânfora ao ombro
a imagem do conga nas águas do Kuango,
ele fica na porta da senzala
de mão no queixo e cachimbo na boca,
varado de angústia,
olhando o horizonte,
calado, dormente,
pensando,
sofrendo,
chorando.
morrendo.
Banzo-Menotti del Picchia
Menotti del Picchia foi um importante escritor modernista. Suas obras permanecem atuais até hoje. Obedecendo à estética do movimento, que buscava se opor à frieza forma do parnasianismo, ele trabalhou temáticas nacionalistas em sua carreira; este poema é fruto do resgate que o autor fez da história brasileira, muito embora não seja a temática principal que norteia suas obras.
O poema “Banzo” situa-se na época das grandes navegações, quando os negros africanos, enganados pelos portugueses, trocaram suas aldeias, religiões e culturas por missangas e consequentemente terminaram escravizados em senzalas. Os versos deste poema são livres e revelam a vida do negro antes de sua escravidão, como os rituais de feitiçaria baseados em ídolos sagrados e seus costumes, como moradias de folhas de palmeira e jarros. A passagem “desespero covarde”, usado pelo escritor no sétimo verso revela o desespero e horror sofridos pelos negros, desejosos de vingança e fuga, mas impotentes para realizá-lo, ficando então sob o domínio português.
Os últimos nove versos expõem a nova perspectiva de vida deles, que saudosos de sua terra natal, já cruelmente escravizados em sanzalas; lembram, depois choram e por fim morrem de saudades. É curioso observar a habilidade do autor em conduzir a gradação, nesses últimos versos do poema que levam à essa expectativa crescente de sofrimento do negro, que culminam nessa sua morte.